‘A Blockbuster riu da nossa cara’: o ‘não’ que fez nascer o império de US$ 420 bilhões da Netflix

Teve fila de espera na porta, plateia cheia e gente encostada nos corredores do Arena Stage, o principal palco do South Summit Madri. Tudo para ouvir Marc Randolph, cofundador da Netflix.

Durante cerca de 30 minutos, ele narrou a origem da empresa, o dia em que quase a venderam para a Blockbuster, e o que aprenderam com os testes que não funcionaram.

A empresa ainda era pequena, operava com DVDs enviados pelo correio e acumulava perdas de 50 milhões de dólares.

A solução, pensaram ele e o cofundador Reed Hastings, era propor uma fusão.

Marcaram uma reunião com a Blockbuster em Dallas. “Eles riram da nossa cara”, disse Randolph. “E foi uma longa viagem de volta.”

Hoje, a Netflix vale mais de 420 bilhões de dólares. E a recusa virou símbolo da cegueira de grandes corporações diante de mudanças inevitáveis.

Mas o ponto que mais chama a atenção – da plateia do South Summit e de quem escuta a história contada pelo empreendedor – é que Randolph não tenta reescrever a história como se tudo tivesse sido planejado. Ao contrário.

“A gente só conseguiu porque criou um processo para testar ideias ruins rápido. Era isso ou quebrar.”

A frase foi dita no palco, mas também resume a cultura que ele ajudou a formar na Netflix. E que segue sendo sua principal bandeira ao orientar startups e novos empreendedores.

A recusa da Blockbuster e o começo da virada

Na época da reunião, a Blockbuster tinha mais de 60.000 funcionários e quase 9.000 lojas.

A Netflix, por outro lado, tinha pouco mais de 100 pessoas e faturava 5 milhões por ano. A proposta: unir forças.

“Eles ficariam com as lojas, a gente com o online. Um modelo híbrido”, disse.

A reação foi imediata. “Eles riram da nossa cara. Aquilo que, para a gente, era uma chance de sobreviver, para eles parecia uma piada.

Depois da recusa, a realidade bateu. Sem comprador e sem caixa, o time da Netflix teve que se reorganizar. Cortes de pessoal, redução de salários e foco total em encontrar um modelo viável.

A resposta veio com o modelo de assinatura — sem prazos de devolução e sem multas. Foi a primeira vez em que a empresa sentiu tração real.

A cultura como ferramenta de escala

Randolph defende que o diferencial da Netflix não foi a tecnologia, e sim a cultura criada desde os primeiros dias. “Cultura não é o que você escreve no site da empresa. É o que as pessoas aprendem umas com as outras no dia a dia.”

Desde cedo, a empresa operava com uma política mínima de regras. Nada de guias de viagem, limite de despesas ou controle de férias.

“A regra era: use seu bom julgamento”, explicou. Isso exigia um cuidado obsessivo com quem era contratado e com o acesso à informação para tomar decisões.

Um bom exemplo, segundo ele, era a meta pessoal de Reed Hastings quando era CEO: passar o maior tempo possível sem precisar tomar decisões. “Se você tem as pessoas certas, com as informações certas, elas decidem melhor do que você.”

A armadilha comum, segundo Randolph, é criar processos para compensar contratações ruins.

“Você começa a proteger a empresa de quem tem mau julgamento. E aí vem a burocracia. A gente foi na direção contrária: construir uma cultura que só funciona com gente que sabe decidir bem.”

Outro ponto central era a honestidade radical entre os times. “Se você diz que valoriza transparência, mas tolera um gestor que grita ou manipula, a cultura se quebra. A cultura vem do exemplo. O que você tolera, você reforça.”

Ideias ruins, testes rápidos

Randolph derrubou um mito comum no mundo das startups: o valor da boa ideia.

“O problema não é ter boas ideias. O problema é transformar uma boa ideia em algo que funcione no mundo real. E isso só acontece depois que você testa dezenas de ideias ruins.”

o início da Netflix, cada nova ideia levava semanas para ir ao ar. Tinha layout polido, cópia profissional, testes técnicos.

“A gente gastava muito tempo e energia, e quando a ideia falhava, era um desperdício.” Aos poucos, aprenderam a testar mais rápido, com menos perfeição. “E descobrimos que o cliente responde mesmo quando o teste está feio – se a ideia for boa.”

Foi assim que nasceu o modelo de assinatura, que virou o principal diferencial da empresa nos primeiros anos.

Fonte: Exame

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